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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Orientalismo XI - Fundamentalismo Islâmico


Fundamentalismo islâmico é um termo de origem do islamismo ocidental utilizado para definir a ideologia política e religiosa fundamentalista que supostamente sustenta o islamismo; pragmaticamente de origem midiática, este termo definido no ocidente pelo senso comum, definindo o Islã como não apenas uma religião mas um sistema que também governa os imperativos políticos, econômicos, culturais e sociais do estado, quebrando o paradigma de estados laicos, comum nesta parte do planeta.

Um objetivo crucial do fundamentalismo islâmico, definido pelo ocidente é a tomada de controle do Estado por forma a implementar o sistema islamista, ou seja, que abrigue e coordene todos os aspectos sociais de uma sociedade através da sharia islâmica.

No seguimento dos ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001, ocorridos nos Estados Unidos, o fundamentalismo islâmico e outros movimentos políticos inspirados por Bin Laden ganharam uma crescente atenção por parte dos meios de comunicação ocidentais, originando-se daí esta definição. A mídia confunde muitas vezes o termo "fundamentalismo islâmico" com outros termos relacionados ao islamismo em geral; apesar das organizações e pessoas que os representam não serem mutualmente exclusivos, em termos mais estritos, cada termo tem uma definição distinta. O governo do presidente norte-americano George W. Bush declarou oficialmente um estado de guerra permanente contra tais ataques, denominado de "Guerra ao Terror" (em inglês: War on Terror).

O conceito de fundamentalismo islâmico designa a aspiração da instauração de um estado islâmico, a introdução da charia, ou a própria aplicação dela, do direito islâmico e ao seguimento das normas de Maomé e dos primeiros quatro Califas Sunitas, sem, no entanto, renunciar aos benefícios da técnica moderna. Inicialmente, o termo ocidental "fundamentalismo" foi rejeitado, mas hoje eles defendem-se a si próprios como fundamentalistas.

O termo "fundamentalista" (usuli) existe no islã há séculos; a palavra designa no sentido tradicional apenas os acadêmicos da ilm al-usul, a ciência que se dedica ao estudo do fiqh (direito islâmico).

O acadêmico Bernard Lewis caracterizou o termo como infeliz e enganador, uma vez que ele foi usado originariamente no cristianismo. Ali, ele designa normalmente as correntes protestantes que pretenderam reacender as fontes divinas da Bíblia, valorizando o texto bíblico face às hierarquias estabelecidas em seu nome (sobretudo Lutero), e proclamavam a sua infalibilidade. Lewis chama a atenção para o fato de no Islã não ter havido até agora alguém que manifestasse dúvidas na origem divina do Alcorão (com uma exceção famosa, ver Versos satânicos) e desde logo todo muçulmano, ou seja, seguidor do islamismo, de acordo com a definição estrita, é um fundamentalista.

História

Os movimentos fundamentalistas islâmicos desenvolveram-se durante o século XX em reação a vários acontecimentos. Depois da Primeira Guerra Mundial, a dissolução do Império Otomano e do califado de Mustafá Kemal Atatürk (fundador da Turquia), alguns muçulmanos sentiram a sua identidade religiosa ameaçada pela influência das ideias ocidentais, como consequência do domínio econômico e militar dos países ocidentais. Durante a década de 1960, a ideologia predominante no mundo árabe era o Pan-arabismo, que punha menor ênfase na religião e se empenhava na criação de um estado secular socialista, inspirado mais no nacionalismo árabe que no Islã. Uma das figuras de proa desta ideologia foi o sírio Michel Aflaq, o fundador do partido Baath, que estudou na Sorbonne nos anos 30, tempos das lutas ideológicas na Europa. Ficou fascinado pelo regime Nazi, o pangermanismo de Adolf Hitler. Ele cunhou como poucos a ideologia do Pan-arabismo, que pretende a união dos países de língua árabe sob um comando único.

Vários governos baseados no nacionalismo árabe debateram-se muitas vezes com problemas de estagnação econômica e conflitos sociais. Alguns muçulmanos culpam os males das suas sociedades no influxo de ideias "estrangeiras". Um regresso aos princípios do Islã é percepcionado por eles como a cura natural. Um tema islamista persistente é que os muçulmanos são perseguidos pelo ocidente e outros estrangeiros. Neste fundo geral, as ideias fundamentalistas desenvolveram-se em diferentes cenários.

O movimento deobandi

Na Índia, o movimento deobandi foi uma reação às ações do Reino Unido contra muçulmanos e a influência de Sayed Ahmad Khan, que era um defensor da reforma e modernização do Islã.

O movimento recebe o nome da cidade de Deoband, onde ele surgiu, tendo sido contruido à volta de escolas islâmicas (sobretudo a de Darul Uloom) e ensinava uma interpretação do Islã que encoraja a subserviência da mulher, desencorajando o uso de muitas formas de tecnologia e de entretenimento, e acreditava que apenas o conhecimento "revelado" ou inspirado por Deus deveria ser seguido.

Apesar da filosofia deobandi ser puritana e desejar remover quaisquer influências não-muçulmanas (i.e. hindu e ocidental) das sociedades muçulmanas, não foi particularmente violenta ou prosélita, confinando a sua atividade sobretudo no estabelecimento de madraçais, escolas religiosas muçulmanas. Estas escolas chegam agora às dezenas de milhar por toda a Ásia, sobretudo no Paquistão e Índia, e permanecem o centro do movimento deobandi. Elas são um dos grandes componentes do Islã na região (os seguidores de Sayed Ahmad Khan são uma minoria que, no entanto, é relevante dentro deste grupo). O movimento Taliban no Afeganistão é um produto da filosofia deobandi e dos madraçais.


Sayed Abul ala Mawdudi

Sayed Abul Ala Mawdudi foi uma figura importante nos princípios do século XX na Índia, e depois da Independência da Índia, no Paquistão.

Fortemente influenciado pela ideologia deobandi, ele defendia a criação de um estado islâmico que aplicasse a charia (a lei islâmica), como interpretada pelos conselhos Shura. Mawdudi fundou a Jamaat-e-Islami em 1941 e foi o seu líder até à sua morte em 1972. O seu livro muito influente, "Para melhor compreender o Islã" (Risalah Diniyatem árabe), teorizava o Islã no contexto moderno e permitiu não apenas aos conservadores ulema mas também modernizadores liberais tais como Al-Faruqi, cujo livro "Islamização do Conhecimento" completava alguns dos princípios fundamentais de Mawdudi, entre os quais a compatibilidade básica do Islã com uma visão ética científica. Citando da própria obra de Mawdudi:

Tudo no Universo é Muçulmano pois tudo obedece a Deus pela submissão às suas leis... Em toda a sua vida, desde o estado embriônico até à dissolução do corpo após a morte, cada tecido dos seus músculos e cada membro do seu corpo segue o curso prescrito pelas leis de Deus. A sua língua, que pela sua ignorância defenda a negação de Deus ou professe divindades múltiplas, é na sua própria natureza "Muçulmana"... Aquele que negar Deus é um Kafir ("escondedor"), porque ele esconde, pela sua descrença, o que é inerente à sua natureza e embalsamado na sua alma. Todo o seu corpo funciona em obediência a esse instinto... A realidade torna-se-lhe alienada e ele tateia na escuridão.

Inerente a esta visão está uma total intolerância pelos costumes não-muçulmanos.


A Irmandade Muçulmana

As ideias de Mawdudi influenciaram fortemente Sayyid Qutb no Egito. Qutb foi um dos principais filósofos do movimento da Sociedade de irmãos muçulmanos que começou no Egito em 1928 e que foi banido (mas que continua a existir ilegalmente) após confrontações com o presidente Egípcio Gamal Abdel Nasser, que mandou executar Qutb e muitos outros. A irmandade muçulmana (fundada por Hassan al-Banna) defendia um regresso à charia por causa daquilo que era por eles percebido como a incapacidade de os valores ocidentais assegurarem a harmonia e a felicidade dos muçulmanos.

Partindo do pressuposto que apenas a providência divina poderia levar os humanos a serem felizes, concluiu-se que os Muçulmanos deveriam evitar a democracia e viver de acordo com a doutrina por Deus inspirada (charia). A Irmandade foi um dos primeiros grupos a invocar a jihad contra todos aqueles que não fossem seguidores do Islã. Nas palavras de al-Banna: "Terras muçulmanas foram atropeladas e a sua honra manchada. Adversários seus tomam conta dos seus negócios e os ritos das suas religiões deixaram de se estender apenas aos seus próprios domínios, para não falar da sua impotência em espalhar as convocações (abraçar o Islã). Deste modo, tornou-se uma obrigação individual, à qual não há escapatória, de cada Muçulmano preparar o seu equipamento, decidir-se a participar na jihad, e preparar-se para ela até que a oportunidade seja oportuna e Deus decrete uma matéria que é certo que será completada..."

Movimentos da Jihad Islâmica

Esta exortação foi seguida pela organização egípcia Jihad Islâmica Egípcia, responsável pelo assassinato de Anwar Sadat, mas com uma peculiaridade: a Jihad Islâmica focou os seus esforços em líderes "apóstatas" (seculares) de estados islâmicos, aqueles que foram seculares e introduziram ideias ocidentais às sociedades islâmicas. As suas visões ficaram patentes num panfleto escrito por "Muhammad Abd al-Salaam Farag", que disse: "...não há dúvida de que o primeiro campo de batalha para a jihad é o extermínio destes líderes infiéis e a sua substituição por uma completa ordem islâmica..."

Um outro movimento da Jihad islâmica surgiu na Palestina como um desdobramento do grupo egípcio, e iniciou atividade militar contra o Estado de Israel.


Wahhabismo

Outro ramo influente do pensamento islamista veio do movimento wahhabita na Arábia Saudita. O movimento Wahhabita (termo ocidental midiático) surgiu no século XVIII, baseado fundamentalmente no monoteísmo do Alcorão e da sunnah, resgatado por Muhammad ibn Abd al-Wahhab. Neste resgate, levantou-se a questão que seria necessário viver de acordo com os ditames estritos do islã, que eles interpretavam como a vida de acordo com os ensinamentos do profeta Maomé e os seus seguidores durante o século VII, em Medina. Consequentemente, eles opunham-se a muitas inovações desenvolvidas desde esse tempo, incluindo o minarete, orações perante a sepulturas de seus antepassados, considerando atos de idolatria, e mais tarde televisões e rádios. Muhammad ibn Abd al-Wahhab, também nesse resgate, considerou que aqueles Muçulmanos que violam as interpretações da sunnah e do Alcorão são heréticos, e que estes deveriam sofrer punições.

Quando o rei Abdul Aziz al-Saud fundou a Arábia Saudita, ele trouxe consigo estes resgates que Muhammad ibn Abd al-Wahhab realizou para o poder. Com o crescer da proeminência Saudita, este movimento espalhou-se, em especial após o Embargo ao petróleo de 1973 e o consequente acréscimo da riqueza da Arábia Saudita.


Fundamentalismo islâmico moderno

O fundamentalismo islâmico conheceu vários desenvolvimentos políticos e filosóficos na parte inicial do século XX, mas não foi até aos anos da década de 1980 que ganhou destaque na arena internacional.

A revolução de Khomeini no Irã, apesar do seu carácter xiita, ofereceu uma inspiração a muitos radicais islamistas e serviu como um exemplo de como um estado islâmico é estabelecido.

Durante o conflito com a União Soviética, no Afeganistão, muitos islamistas juntaram-se para combater aquilo que eles viam como uma força invasora ateísta. Esta confluência resultou nas muitas alianças que foram feitas entre grupos de ideologias semelhantes. Entre as ocorrências dignas de nota, Osama bin Laden, um saudita influenciado pelo wahhabismo e pelos escritos de Sayed Qutb, juntou forças com a Jihad Islâmica Egípcia, sob a influência de Ayman al-Zawahiri, para formar aquilo que hoje se chama de Al-Qaeda.

Na sequência dessa luta contra a União Soviética, surgiu o movimento deobandi Taliban, o qual bin Laden ajudou a influenciar para tomar direções mais radicais, após a sua chegada ao Afeganistão de 1996.

Fundamentalistas islâmicos também estão ativos na Argelia, nos territórios palestinianos, Sudão e Nigéria.

Muita da atividade fundamentalista islâmica tem sido dirigida contra governos de sociedades muçulmanas aos quais os fundamentalistas se opõem porque eles são governos que se regem pela lei humana e não pela lei divina.

Um esforço considerável foi dirigido também ao combate de alvos ocidentais, especialmente os Estados Unidos. Os EUA em particular são um alvo da ira dos Fundamentalistas islâmicos pelo seu apoio ao Estado de Israel e o seu apoio a regimes aos quais os fundamentalistas se opõem. Adicionalmente, alguns fundamentalistas concentraram a sua atividade contra Israel e quase todos veem Israel com hostilidade. Osama bin Laden, pelo menos, acreditava que isto é uma necessidade devido ao conflito histórico entre Muçulmanos e Judeus e considerava que existe uma aliança judaico-americana contra o islã.

Há algum debate quanto à questão de saber em que medida os movimentos fundamentalistas islâmicos permanecem influentes. Alguns acadêmicos afirmam que o fundamentalismo islâmico é o movimento de uma margem que está morrendo, como se pode ver no falhanço claro de governos fundamentalistas islâmicos como no Sudão, o regime saudita wahhabista, e os taliban, em melhorar a qualidade de vida dos muçulmanos.

Outros, no entanto, (por exemplo Ahmed Rashid) acham que os fundamentalistas ainda recebem apoio popular considerável, citando o fato de que candidatos fundamentalistas no Paquistão e Egito regularmente obtêm entre 10 e 30 por cento de sondagens eleitorais (as quais muitos acham que sejam manipuladas contra eles).

Movimentos fundamentalistas islâmicos

  • Internacional - Al-Qaeda, liderado por Osama bin Laden
  • Afeganistão - Talibã
  • Argélia - GIA , Frente de Salvação Islâmica , GSPC
  • Egito - Gama'at Islamiya
  • Líbano - Hezbollah
  • Somália - Al-Shabaab
  • Sul da Ásia - Jamaat-e-Islami (existente na Índia, Paquistão, Bangladesh, Sri Lanka, Caxemira)
  • Sudeste Asiático - Jemaah Islamiyah
  • Filipinas - Moro Islamic Liberation Front
  • Margem Ocidental do Rio Jordão e Faixa de Gaza - Hamas, Jihad Islâmica da Palestina
  • Arábia Saudita - Wahhabismo

Bibliografia:

. Para Compreender o Islã, Frithjof Schuon, Editora Record/Nova Era, 2006.
· Homens de um Livro Só: Fundamentalismo no Islã, no Cristianismo e no pensamento moderno, Mateus Soares de Azevedo , Editora Best Seller, 2008.
· Iniciação ao Islã e Sufismo, Mateus Soares de Azevedo, Editora Record, 2001.
· Children of Abraham: An Introduction to Islam for Jews, Khalid Duran with Abdelwahab Hechiche, The American Jewish Committee and Ktav, 2001
· The Islamism Debate, Martin Kramer, University Press, 1997
· Liberal Islam: A Sourcebook, Charles Kurzman, Oxford University Press, 1998
· The Vanguard of the Islamic Revolution: The Jama'at-i Islami of Pakistan, Vali Nasr, Univ. of California Press, 1994
· The Failure of Political Islam, Olivier Roy, Harvard Univ. Press, 1994
· The Challenge of Fundamentalism: Political Islam and the New World Disorder, Bassam Tibi, Univ. of California Press, 1998


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