Longamente peregrinei
Por este mundo de coisas efêmeras.
Dele conheci os passageiros deleites.
Como o belo arco-íris,
Que muito cedo em nada se desfaz,
Assim, desde as origens do mundo,
Vi todas as coisas passarem –
Belas, festivas, deleitáveis.
Na busca do Eterno
Perdi-me entre coisa finitas;
No perpassar das idades,
Conheci as delícias do mundo efêmero –
A terna mãe com seus filhos,
O arrogante e o livre,
O mendigo que erra pela face da terra,
O conforto dos ricos,
A mulher tentadora,
O belo e o feio,
O autoritário, o poderoso,
O homem importante, o benfeitor, o protetor,
O oprimido e o opressor,
O libertador e o tirano,
O homem de muitas posses,
O renunciante – o sannyasi;
O homem prático e o sonhador,
O arrogante sacerdote de suntuosas vestes e o humilde devoto,
O poeta, o artista, o criador.
Prostrei-me diante dos altares do mundo,
Conheci uma a uma as religiões.
Cerimônias inúmeras pratiquei,
Regalei-me das pompas do mundo,
Combatente fui, de batalhas ganhas e perdidas,
Desprezei e fui desprezado,
Passei pelas tristezas e agonias
De inúmeras desditas,
Nadei em prazeres e na opulência.
Nos secretos recantos de meu coração, exultei,
Conheci nascimentos e mortes sem conta,
Todas essas efêmeras esferas percorri,
Entre êxtases passageiros, certo de sua perenidade,
No entanto, jamais encontrei o eterno Reino da Felicidade.
Outrora
Eu te buscava –
Ó Verdade eterna,
Culminância de toda Sabedoria!
No topo da montanha,
No céu constelado,
Nas sombras do terno luar,
Nos templos do homem,
Nos livros dos doutos,
Na tenra folha primaveril,
Nas águas irrequietas,
No rosto do homem,
No regato cantarolante,
Na tristeza, na dor,
Na alegria e no êxtase –
Mas não Te encontrei.
Assim como o montanhista ascende aos altos picos,
Largando a cada passo seus múltiplos fardos,
Assim também me alcei às alturas,
Abandonando as coisas transitórias.
Como o sannyasi de áureas vestes,
A buscar felicidade, com sua taça de mendicante,
Assim também renunciei.
Como o jardineiro que mata
As ervas daninhas de seu jardim,
Assim também aniquilei o ego.
Como os ventos,
Sou livre e sem entraves.
Fortes e diligente como o vento
Que penetra os ocultos recantos do vale,
Rebusquei
Os recessos de minha alma,
Purificando-me de todas as coisas,
Passadas e presentes.
Qual o silêncio que, de súbito,
Se estende sobre o mundo rumoroso,
Assim também, subitamente, Te encontrei
No fundo do coração de todas as coisas e do meu próprio.
Sobre a trilha da montanha,
Sentado numa pedra,
A meu lado e dentro de mim Te encontrei
E, em Ti e em mim contidas, todas as coisas.
Feliz o homem que em tudo que depara encontra a Ti e a mim,
Na luz do sol poente,
A filtrar-se entre as delicadas rendas de uma árvores primaveril,
Eu Te contemplei.
Nas lucilantes estrelas
Te contemplei.
Na ave que passa célere
E desaparece no negror da montanha,
Te contemplei.
Tua glória despertou a glória que em mim dormia.
Tendo encontrado, ó mundo,
A Verdade, a Felicidade eterna,
Dela desejo dar.
Vem, meditemos juntos,
Juntos ponderemos e sejamos felizes,
Raciocinemos juntos e façamos surgir a Felicidade.
Tendo provado
E conhecido a pleno as tristezas e dores,
Os êxtases e alegrias
Deste mundo efêmero,
Compreendo tua aflição.
A glória de uma borboleta só dura um dia,
Assim também, ó mundo, são teus deleites e prazeres.
Como as tristezas da criança,
Assim, ó mundo, são tuas tristezas e dores,
Teus prazeres, que levam a constante aflição,
Tuas desditas, que geram maiores desditas,
Incessante luta e fúteis vitórias.
Como o delicado botão,
Após padecer longo inverno,
Desabrocha e de fragrâncias o ar embalsama,
Para murchar antes de cair o sol,
Assim são tuas lutas, teus grandes feitos, e tua morte-
- Uma roda de dor e de prazer,
De nascimento e morte.
Assim como andei perdido entre as coisas transitórias,
Em busca daquela eterna Felicidade,
Assim também tu, ó mundo, estás perdido na esfera do efêmero.
Desperta e reúne tuas forças,
Olha em torno e medita.
Aquela Felicidade imarcescível,
Felicidade que é a única Verdade,
Que é o fim de toda busca,
De toda indagação e dúvida,
Que liberta do nascimento e da morte,
Felicidade que é a única lei,
O único refúgio,
A fonte de todas as coisas,
Que dá perene conforto,
Essa real Felicidade, que é Iluminação,
Em ti habita.
Tendo-me fortalecido,
Desejo dar
Desta Felicidade.
Tendo alcançado o desprendimento afetuoso,
Desejo dar
Desta Felicidade.
Tendo alcançado a tranqüilidade apaixonada,
Desejo dar
Desta Felicidade.
Tendo vencido a vida e a morte,
Desejo dar
Desta Felicidade.
Larga, ó mundo, tuas vaidades
E segue-me,
Pois sei o caminho que leva ao cume da montanha,
Sei o caminho que leva ao fim desta agitação e tormento.
Só existe
Uma Verdade,
Uma Lei,
Um Refúgio,
Um Guia
Para aquela eterna Felicidade.
Desperta, ergue-te
Medita e reúne tuas forças.
Autor: Jiddu Krishnamurti
Livro: A BUSCA (páginas 5 a 16 ) - 4ª Edição
Editora: INSTITUIÇÃO CULTURAL KRISHNAMURTI
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